domingo, 24 de abril de 2011

Eu morri há dias e agora me refaço.


Eu morri há dias e agora me refaço; me refaço dos pedaços mal somados.

(...)Foi quando eu me peguei lendo e esquecendo, esquecendo daquilo que eu sou e daquilo que fui. Esqueci por segundos; os melhores segundos esquecidos. Morri há dias e hoje renasço em mim. Hoje, ainda perdido em devaneios eu me encontrei; encontrei-me em um eu que não conhecia. Abri meus olhos. Olhei no espelho e vi coisas outrora nunca vistas; vi um eu morto que revivia, agora, como uma fênix. Voltei das cinzas em chamas. Ainda brilho com o fervor, fervor de ódio e de alegria, de uma felicidade extremamente irritante. Passei por aquelas mudanças truculentas e sem volta, eu que tanto busquei por revoluções... Alcancei-as.
Eu que agora não vejo mais, não acredito e não ouço; com os olhos vendados por fogo cruzado, não enxergo e com os ouvidos entupidos pelas cinzas, não ouço. Declaro guerra com o ser que se aproxima e que vive na escuridão, declaro guerra com minha sombra que me permitiu perder-me no inferno e voltar para terra. Fui, perdi-me, alcancei-me e agora retorno. Não, eu não retorno. Meu eu morreu assim como quem morre de vida pra morte; morro pra renascer sem deixar meu corpo. Morro em alma, mas meus laços carnais impedem-na de deixar-me.  Esse sou eu, essa é a malignidade corrompendo a luz. Esses são os temidos laços de amor, laços de amor que são cortados por tesouras sem pontas; sem importâncias e sem lágrimas. Sem lágrimas que matam, vazio que destrói. Vai corrompendo a alma até os confins que uivam quando alcançados. Porque a gente destrói, destrói tudo que encontra. Eu destruo, eu invento pra ter a fome e o prazer de destruir aquilo que criei. Eu sou o mais perverso de mim. Minha revolução monstruosa; tô aqui clamando por luz. Tô com sede de paz pruma guerra interminável. Renasci a pouco e já busco luz, porque renasci das trevas – renasci do amor corrompido, esmagado e cuspido – renasci da obscuridade de minha alma que me acompanha. Eu que agora rezo, rezo para que minha alma se encha de luz e ilumine a escuridão de minha sombra. Rezo para que meus olhos possam enxergar sem lágrimas. Eu rezo, meu Deus, para que meu coração possa filtrar sangue mais uma vez. Eu rezo para que eu possa beber o amor vivo; pleno e sagaz. Eu busco me livrar desse novo eu que já é velho, que de tão pouca vida já é amargo. Eu vou buscando rezar enquanto eu me livro de mim que já não sou. Eu vou lutando e criando novas guerras e novos caminhos a cantos inimagináveis que existem aqui dentro e que crio segundo a segundo, vou inventado um novo país de sentimentos que desconheço e que se tornam perigosos – mesmo pra mim. Vou enchendo-me de rascunhos enquanto a vida acontece, enquanto não encontro a fonte. Eu vou buscando as fontes, eu vou rezando, eu vou vendo você com lágrimas nos olhos, eu vou liberando meus sonhos, eu vou dando asas pro amor que não tenho. 

Desse amor vomitado.

sábado, 16 de abril de 2011

Meu sangue de unicórnio.

A gente vai por aí encontrando essas (des)felicidades de viver.

Vai escrevendo sem ter destinatário. A gente vai jogando garrafas ao mar na esperança de que algum dia alguém leia; e assim imaginamos que alguém encontrou e leu e que se sentiu bem, que se sentiu confortável por não estar sozinho. Sentiu-se feliz por não ser o único a morrer mortes de vida.  (Por vezes a gente pensa que alguém a encontrou, leu, riu, amassou-a e jogou-a ao mar.) A gente sofre pelo inacontecido e pelo que nos foge, a gente pisa no ínfero e chora porque o mundo não é justo. Desfelicidades somos todos nós; fazemos malabarismo com utopias e de repente a gente percebe que não é artista circense – a gente deixa tudo cair por terra. Por terra caímos a vida inteira; a gente morre quando acorda. Porque a gente pode, a gente deve e a gente faz. E aí a vida perde sua graça que não era tão engraçada; a vida vai se contorcendo até chegar a seu ótimo – insuportável. Aí a vida pede por um pouco de felicidade, pede por coisas que a gente não pode e coisas que a gente não deve; e a gente se alimenta, às vezes faz greve de fome, mas alimenta-se com a autofagia da alma. É quando o basta não basta mais. É quando o final se torna começo e o início caminha pelo fim. É quando a gente corre somente para se sentir cansado. É quando eu venho e escrevo o que eu não entendo, mas que eu sei, alguém entenderá. E mesmo que o Alguém Entenderá não leia, eu escrevo. Porque o que eu escrevo me liberta, me liberta do Eu. Escrever me entrega à Gente e me faz sentir parte de todos e todos me sentirem insensivelmente, porque a gente sente - mesmo não sentindo. Porque eu escondo aqui – nas entrelinhas – todo meu vazio, toda minha solidão. Escondidos atrás dessa película de superficialidade que eu trago no sorriso e nas palavras e nos gestos. Eu finjo estar vivendo e finjo ter alguém, eu vou fingindo que tô levando a vida e que ela tá me levando. A gente finge junto, a gente se esconde na obscuridade dos nossos seres pra tentar ser melhor, por medo ou por qualquer outra coisa que a gente não sabe dar nome. A gente vai por aí se entregando e se guardando pro próximo; pro amanhã. Que amanhã não chega, porque amanhã é hoje. E hoje é amanhã que já passou. Eu escrevo no amanhã, escrevo no hoje e escrevo no ontem – escrevo nas linhas dos tempos que jamais se apagam, se esquecem, mas não se apagam. Escrevo minha alma em palavras, porque sinto e porque grito em escrita. Porque é aqui que desfaço e entrego-me mais uma vez, aqui eu me apresento sem minhas talas e curativos; apresento-me a você, mais uma vez o meu eu que vive intrinsecamente devorado. Devorado e devotado por meus fantasmas, por minhas figuras complexas que inventei. Invento aquilo que me destrói, invento! O doce amargo da morbidez; meu líquido de vida, minha vida escorrendo por meus dentes. É meu sangue de unicórnio, sou eu. Eu tento, eu tô tentando, eu vou levando aquilo que me mata e que me machuca e que me derrota; eu vou levando no coração os fantasmas e assombros que criei. 

Eu vou levando no coração a escuridão que me obscurece por inteiro. Eu vou levando, vou fingindo; a gente vai por aí. Se encontrando e se desfazendo – mas a gente vai.

sábado, 9 de abril de 2011

Moment.

É quase um vazio, mas não é. Porque vazio é muito forte, é muito agudo, falo sobre uma pequena extensão, um pequeno lugarzinho aqui dentro que vai se extinguindo. Não é de corpo e alma não, é só um resquício de espírito que tá me faltando, mas logo volta. Logo volta em meses, porque esperar não é fácil não, amigo. Eu mesmo descobri, e vou descobrindo assim; andando sem parar pra pensar. Porque parar machuca e recomeçar dói. Sabe como é, não sabe? É aquilo que eu tinha que dizer e não disse, é aquilo que eu não podia e fiz, é aquilo que a gente quer e não pode. Não, não é isso não. Isso aqui é o inverso do querer; é andar até certo ponto e perceber que não há mais estradas. E não se engana não, ainda há muito desejo. Desejo de amor, de paz de espírito que me falta, é um desejo que grita e que uiva, que reverbera silencioso. Descobri a pouco que não era dor; corri pra cá pra te contar. É coisa estranha, é coisa não sentida que se sente. É uma luta de independência que a gente trava obscuramente pra se libertar dos suplícios que nossos Reis nos infringem. Ironicamente ainda me sobra a outra parte daquilo que perdi; me sobra o que me machuca, o que me machuca mas pela falta me impede de sentir dor. Cair e machucar-me todo, ferir a alma com um único tombo – de uma única montanha –, e é assim que a gente vai aprendendo a se cuidar. Assim a gente vai levando, caindo e esperneando até não sobrar mais nada; até a gente eliminar aos poucos essa parte que machuca, que é áspera e que, aos desapercebidos, soa como alívio. Assim a gente vai se esvaindo por nossas veias sem sequer derramar lágrimas de sangue, gotas de alma. A gente vai perdendo e vai ganhando sem pestanejar, a gente é gente. A gente acaba por morrer sem sentir dor.