quinta-feira, 9 de junho de 2011

Voltimeia a gente pode enxergar no escuro.


“A felicidade somos nós.” Disse ao som duma voz calmamente longínqua, reverberava em mim com tal intensidade que vivi por instantes outra vida de quem se é felicidade pura. Fui felicidade plena enquanto ouvia tudo aquilo que já não podia mais ouvir. Era como se, ah!, era como se todas as palavras estivessem dançando pela sala, eram bailarinas que aos saltos e rodopios chegavam a mim e me elevavam. Era como se soubessem de todas as minhas trancas e cadeados que me mantinham ali, em mim. E se fosse por acaso; eram minhas mesmo assim! Eram minhas as palavras – não as que me descreviam – eram minhas as palavras que descreviam minha prisão. E tudo, por que era só? Não, porque o só de repente tornara-se tudo, e o tudo, como já diziam “... era uma coisa só.”. Foi quando me atiraram a pedra que levantaram contra Maria Madalena, senti o peso da infelicidade que só era minha porque eu a acolhera – ajoelhei-me e rezei, era tudo. Era tudo o que eu poderia fazer para esquivar-me de tal suplício; suplício de vida que eu já vivia há muito tempo. Tempo entorpecido pelo veneno que agora sugavam de minhas veias, e minha alma que voltava, mal pude ver e já me voltava. E como, meu Deus, eu a perdera e nem percebera. Oh, mundo de horror que agora não vivo mais. Tamanho horror foi revelado a mim, naqueles minutos intrisecantes em que estive na gruta que me era ao avesso. Eu estava sendo-me todo ao avesso e era este, e apenas este o caminho para a fonte de água límpida; de alma lavada. Eu beberia a água da fonte, eu comeria minha própria alma que já não me era. E então, subitamente, a luz se acendeu – eu estava de volta aos ossos secos. Então, eu, apenas jurado daqueles que vivem, estava sendo testado pruma nova vida (pruma nova casca) que me servira perfeitamente. Eu, agora que me reconhecera no “...felicidade somos nós.” Eu seria, então, toda essa felicidade que somos nós. Ou não, ou eu apenas abriria os olhos que já estavam cerrados há muito tempo. Ou não, ou eu apenas esperaria sentado, mais alguns segundos, então eu voltaria como se nada houvesse mudado – mas havia, não havia? Havia me transfigurado na frase que agora me era como a água. E a fonte? E a fonte já fora esquecida assim que a encontrei, encontrei água pura de alma. E nunca senti a felicidade tão perto, pois eu a seria enquanto ela me fosse, e seria rápido. Eu sabia que seria rápido. E foi passando, e foi passando e me levando junto – mas não fui. Permaneci ali, sentado – me segurei ao pé da mesa que já era toda contorcida. Eu me segurei e vi a felicidade, olhei para frente e vi o seu reflexo no espelho e, para meu espanto – não era eu.

2 comentários:

  1. A felicidade somos nós. Mas Rimbaud já dizia: O eu é outro. Essa frase me veio logo que li a tua primeira. Não sei, e sei que esse texto me passou rapido feito o assovio, mas daqueles agudos que a gente demora a terminar de ouvir, porque ecoa. Não era eu.

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  2. Eu, inexperiente inconsequente, ainda me pego em devaneios do gênero e: eu ainda não sei. Escrevo agora sobre a necessidade de um outro ser e após isto escrevo sobre a felicidade em si próprio; já não me sei. E se sei, vou vivendo de fragmentos – me permitindo aos momentos – sem realmente saber se sei. “Escute, sinta e repita, por favor.” Ouço, me perco – tento me entender –, repito.

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